Relatório com informações de opositores do governo Bolsonaro será apurado, diz ministro da Justiça

'Não admito perseguição a grupo de qualquer natureza', afirmou

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André Mendonça, advogado-geral da União Credito: José Cruz/Agência Brasil

Por G1 — O ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, afirmou neste domingo (2) que determinou a abertura de apuração interna sobre a possível elaboração de relatório sigiloso de inteligência com informações de servidores públicos que seriam ligados a movimentos contrários ao governo.

De acordo com o portal Uol, a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do MJ elaborou um relatório de caráter sigiloso sobre mais de 500 servidores públicos da área de segurança identificados como integrantes de movimento antifascismo e opositores do presidente Jair Bolsonaro.

“Independente da existência ou não [do relatório], e eu não posso confirmar [a existência], determinei a abertura de uma sindicância para apurar os fatos relacionados, no âmbito do Ministério da Justiça, à produção de relatórios”, afirmou.

De acordo com Mendonça, será composta uma comissão com integrantes do MJ, da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Controladoria-Geral da União para coordenar a sindicância.

Em entrevista à GloboNews, o ministro da Justiça disse que, ao saber de reportagem do portal Uol, procurou a Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do MJ e foi informado de que a secretaria não elabora dossiês desse tipo.

“Então, eu chamo a Secretaria e pergunto: ‘foi elaborado algum dossiê’? E eles me respondem e isso está na nota [do MJ]: ‘Nós não elaboramos dossiê’. ‘Até porque, se nós quiséssemos ou pudéssemos elaborar um dossiê com aquela conotação de prejudicar determinado grupo de forma parcial, persecutória, nós não elaboraríamos um relatório’. Se é que esse relatório, e eu tenho que falar sempre em tese, foi produzido”, afirmou André Mendonça.

Na sequência, André Mendonça disse que, se há um relatório, o documento está “dentro dos procedimentos regulares”. E acrescentou: “Nenhuma dessas possíveis pessoas é investigada por nós no Ministério da Justiça. Não há um tipo de investigação em relação a este grupo que possivelmente assinou esse manifesto [antifascista]”.

‘Não admito perseguição’

O ministro da Justiça disse ainda não admitir “qualquer perseguição a grupo de qualquer natureza”. “Isso é inaceitável no estado democrático de direito”. Ele também disse ser impossível “consentir” com a produção de dossiês contra quem quer que seja.

Questionado sobre o que fará caso fique comprovado que a Seopi elaborou um dossiê contra servidores públicos supostamente ligados a grupos antifascistas ou contrários ao governo, André Mendonça afirmou:

“Se for verificado que há qualquer atuação persecutória ilegítima, essa pessoa [responsável pelo relatório] não tem condições de continuar trabalhando comigo […]. A gente precisa ter serenidade, fazer as apurações devidas. Agora, qualquer indicativo de uma atuação persecutória a grupo A, B ou C, que restrinja, por exemplo, indevidamente, uma manifestação, isso não é aceitável dentro da democracia”.

Mendonça também disse se considerar um antifascista, mas emendou: “não é necessariamente um rótulo que vai dizer o conteúdo de um eventual grupo que se manifesta pelo antifascismo. Nós não podemos, numa questão de segurança, simplesmente por um rótulo deixar de considerar eventos concretos que possam existir e caracterizar um grupo determinado”.

Repercussão

Depois da divulgação da reportagem pelo portal Uol, o Ministério Público Federal pediu esclarecimentos ao Ministério da Justiça. Entidades da sociedade civil também manifestaram preocupação com a possibilidade de o governo estar investigando de forma sigilosa opositores.

O MPF no Rio Grande do Sul abriu um procedimento, no início da semana passada, para cobrar informações do Ministério da Justiça. O órgão quer saber se há elementos que indiquem uma atuação do governo para limitar a liberdade de expressão e deu um prazo de dez dias para o envio de explicações sobre as razões do relatório.

Também no início da semana passada, a Anistia Internacional se manifestou sobre o relatório do Ministério da Justiça. Em nota, disse que exige o fim de toda e qualquer investigação secreta e ilegal contra opositores do governo.

A organização sustenta que toda e qualquer atividade de inteligência do ministério precisa ter como base investigações policiais regulares, motivadas pela ocorrência de crimes, sendo autorizadas e supervisionadas pela autoridade judicial. Caso contrário, consistirá em arbitrariedade, violando os direitos humanos.

O movimento Policiais Antifascismo se manifestou em nota e lembrou que esta “constrangedora medida do governo federal” não é apenas contra o grupo, mas contra todos que amam as liberdades e que laboram pela democracia. Eles afirmam que pedirão a apuração, responsabilização e reparação da verdade em todas as instâncias possíveis.

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) afirmou que é gravíssimo que o Executivo federal pratique a vigilância de vozes dissonantes e de representantes críticos ao governo, numa caçada que remonta a práticas da ditadura militar.

Para a organização, o suposto dossiê “representa uma ameaça flagrante ao estado democrático de direito e aos valores constitucionais por estimular a perseguição à livre expressão de ideias e pensamentos, bem como a posicionamentos políticos”.

Explicações ao Congresso

Na semana passada, os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Jaques Wagner (PT-BA) apresentaram um requerimento em que pedem a convocação de André Mendonça para que, diante de uma comissão, preste esclarecimentos sobre o suposto relatório sigiloso.

Neste domingo, André Mendonça afirmou que está disposto a comparecer voluntariamente ao Congresso para prestar esclarecimentos.

Foto: Reprodução.

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